A pessoa, o lugar, o objeto estão expostos e escondidos ao mesmo tempo sob a luz, e dois olhos não são bastantes para catar o que se oculta no rápido florir de um gesto. É preciso que a lente mágica enriqueça a visão humana e do real de cada coisa um mais seco real extraia para que penetremos fundo no puro enigma das figuras. A fotografia - é o codinome da mais aguda percepção que a nós mesmos nos vai mostrando e da evanescência de tudo edifica uma permanência, cristal do tempo no papel. Das lutas de rua no Rio em 68, que nos resta mais positivo , mais queimante do que as fotos acusadoras, tão vivas hoje como então, a lembrar como a exorcizar? Marcas da enchente e do despejo, do cadáver insepultávelo colchão atirado ao vento, a lodosa, podre favela, o mendigo de Nova Iorquea moça em flor no Jóquei Clube. Garrincha e Nureyev, dança de dois destinos, mães-de-santo na praia-templo de Ipanema, a dama estranha de Ouro Preto, a dor da América Latina, mitos não são, pois que são fotos. Fotografia: arma de amor, de justiça e conhecimento, pelas sete partes do mundo a viajar, a surpreender a tormentosa vida do homem e a esperança a brotar das cinzas. (Carlos Drummond de Andrade) |
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